O PLANO DE IMIGRAÇÃO DE TRUMP: ENTRE RETÓRICA, MEDIDAS DURAS E O
Josimar Salum — 5/7/2025
O debate migratório nos Estados Unidos segue intenso há décadas, mas ganhou contornos ainda mais dramáticos com a ascensão de Donald Trump em 2016. Seu discurso foi marcado por promessas duras de deportação e controle da fronteira, enquanto na prática reconhecia limites econômicos e logísticos para implementar deportações em massa.
No primeiro mandato, Trump apresentou o chamado “Four Pillars”, que previa:
• reforço da segurança de fronteira com US$ 25 bilhões para o muro e tecnologia;
• legalização para cerca de 1,8 milhão de DREAMers (DACA e elegíveis), com caminho à cidadania em 10 a 12 anos;
• fim do visto-loteria de diversidade;
• restrição de imigração familiar a cônjuges e filhos menores.
Esse pacote não avançou no Congresso, mas sintetizou a ideia de Trump: um endurecimento radical em troca de uma legalização muito restrita.
Deportar criminosos como prioridade
Desde 2016, Trump dizia que focaria em deportar criminal aliens, estimados por ele em 2 a 3 milhões de pessoas, embora números oficiais falassem em algo entre 820 mil e 1,9 milhão. Já em 2017, assinou a Executive Order 13768, ampliando o conceito de prioridade para infratores de menor gravidade, aumentando a pressão sobre comunidades imigrantes.
Muro e controle máximo
Trump insistiu que a fronteira deveria ser “resolvida” antes de qualquer regularização mais ampla. Além da construção do muro, reativou políticas como o “Remain in Mexico”, expandiu deportações sumárias (expedited removal) e chegou a cogitar uso do Exército na fronteira.
O dilema econômico: deportar ou sustentar a economia?
Apesar da retórica, Trump admitiu já em 2025 que deportações em massa estavam estrangulando setores inteiros: agricultura, hotelaria, construção civil. Cerca de 42% dos trabalhadores agrícolas entre 2020 e 2022 não tinham status migratório regular. Empresários, inclusive aliados republicanos, denunciaram riscos de colapso produtivo caso as deportações se ampliassem.
DREAMers como moeda de troca
Trump se mostrou disposto a legalizar DREAMers se o Congresso financiasse o muro e limitasse a imigração familiar. Porém, nenhum acordo definitivo avançou.
E os milhões de indocumentados?
Desde sempre, Trump reconheceu ser impossível deportar todos os 11 milhões de indocumentados (estimativa do Pew Research Center) sem abalar a economia. Seu plano não-oficial seguia etapas:
1. fechar a fronteira;
2. deportar criminosos;
3. reformar a imigração legal priorizando méritos;
4. negociar a situação dos DREAMers;
5. e depois, eventualmente, discutir soluções para os demais indocumentados.
No segundo mandato (a partir de 2025), Trump endureceu ainda mais o tom, aprovando a Laken Riley Act, que amplia detenções de imigrantes acusados de crimes, e lançando ideias polêmicas como o Trump Gold Card, oferecendo residência por US$ 5 milhões, além de usar Guantánamo como centro de detenção migratória temporária. Mesmo assim, a estrutura de deportação nos EUA — cerca de 5.500 agentes do ICE — não tem como executar uma remoção em massa de milhões de pessoas.
Quantos realmente são?
A conta oficial de 11 milhões data dos anos 2000 e se mantém repetida. Porém, após o aumento dos encontros na fronteira sob Biden, estudos do Center for Immigration Studies e do Princeton Policy Advisors projetam até 16 milhões de indocumentados em 2024.
Outro dado importante: o IRS já expediu cerca de 23 milhões de ITINs (número de contribuinte para quem não tem Social Security), dos quais 11 milhões estariam ativos. Como cerca de 30% a 40% dos indocumentados nunca pedem ITIN por medo ou informalidade, cálculos de Yale projetam até 22 milhões de pessoas sem status migratório.
Em síntese:
• 11 milhões (Pew) é conservador;
• 14–16 milhões (Migration Policy) é plausível;
• 18–22 milhões (Yale + ITIN) também é defensável como teto superior.
Um contingente populacional maior do que muitos países latino-americanos, que alimenta setores vitais da economia americana.
O Dignity Act: alternativa realista
Diante desse cenário, alguns parlamentares tentaram estruturar soluções mais pragmáticas, como o Dignity Act, apresentado pela deputada republicana María Elvira Salazar. O projeto prevê:
• regularização condicional de indocumentados sem crimes graves, mediante trabalho e pagamento de impostos;
• criação de fundos para reforço da fronteira;
• um status legal imediato, mas green card ou cidadania apenas após 12 anos, evitando anistia imediata e incentivando integração gradual.
A maior oportunidade econômica?
Seja com Trump ou qualquer futuro presidente, a verdade é que integrar de forma planejada e segura até 20 milhões de trabalhadores indocumentados poderia ser o maior estímulo econômico da história dos EUA, muito além de qualquer pacote de infraestrutura.
Trabalhadores legalizados consumiriam mais, comprariam imóveis, abririam negócios e pagariam impostos de forma regular. O Center for American Progress estima que uma legalização completa poderia injetar até US$ 1,2 trilhão no PIB em dez anos.
Além disso, legalizar milhões de jovens e jovens adultos já inseridos no mercado de trabalho representaria uma solução estratégica não apenas econômica, mas social e demográfica, ajudando a sustentar o sistema de previdência e serviços de saúde, cada vez mais pressionados pelo envelhecimento acelerado da população americana.
Politicamente, existe o receio de que uma medida tão ampla seja rotulada como “anistia” e incentive novos fluxos ilegais. Mas se aliada a um sistema de fronteira seguro, com mecanismos efetivos para barrar futuras entradas irregulares, uma reforma migratória estruturada poderia ser altamente vantajosa e equilibrada.
Por isso, propostas como o Dignity Act, que combinam regularização imediata e cidadania apenas no longo prazo (após 12 anos), surgem como alternativas realistas para unir segurança fronteiriça e a necessidade de absorver milhões de imigrantes que já contribuem para a economia.
Em síntese, quem tiver coragem de liderar uma reforma migratória ampla, dentro de regras claras, seguras e sustentáveis, poderá ser lembrado como o presidente que promoveu o maior incentivo econômico, social e demográfico da história moderna americana.
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